Aquilamaris, Aquilamaris, mayday Aquilamaris

Aquilamaris é a mãe.
Eu detesto essa brincadeira , mas os amigos do Percy Neto, meu sobrinho lá de Santos, insistem nela. Basta eu chegar para o coro começar: “Aquilamaris, aquilamaris, socorro aquilamaris”. E o culpado, novamente, é o meu irmão Luiz que não soube explicar a eles a situação dramática que passamos.
Na verdade, eu tive uma experiência traumatizante com minha primeira lanchinha, chamada El Niño. E o Luiz – gozador como ninguém - contou para todos como se fosse piada. E eles agora não perdoam: “Aquilamaris....”.
Vou contar como foi. Vejam se eu não tinha razão em ficar apavorado.
Eu encomendei uma lanchinha maravilhosa em São Paulo, no estaleiro Dumar, e quando ficou pronta escolhi uma Marina do Guarujá para guardar o barco. A Marina chamava-se Áquila Maris.
Essa Marina ficava na praia de Pernambuco, com saída por uma baía chamada de Mar Casado.
Até aí, tudo bem. Testamos o barco no Canal de Bertioga, foram feitos todos os acertos de hélice e comandos, e eu comecei a navegar aos poucos, saindo na primeira navegada com um dos sócios da Marina, para conhecer as redondezas.
Mas, marinheiro de primeira viagem, cometi alguns desatinos nos primeiros passeios, e vou contar alguns deles em breve.
Hoje quero falar desse episódio, que reflete uma ocorrência até comum entre os iniciantes, mas que poderia ter acabado em tragédia.
Num dos primeiros passeios com meu barco, ainda encantado com as possibilidades que se abriam, levei meu irmão Luiz e seus dois filhos, o Tavinho e o Gabriel, para um passeio.
Como ainda não tinha muita experiência, saímos do Mar Casado, demos a volta no morro e resolvemos ancorar na praia de Pernambuco, uma das mais bonitas do Guarujá.
Tudo dentro da normalidade, local abrigado, boa distância da praia, alguns barcos já estavam no local. Escolhemos um ponto e pedi ajuda ao Luiz para jogar a âncora enquanto eu manobrava o barco.
A grande falha estava na manobra de ancoragem. Eu deveria ficar com a proa voltada para o vento e não com a popa. Nesse pequeno descuido, e por total falta de preparo, acabamos ancorando bem em cima da âncora, sem folga no cabo.
Como não sabíamos disso, ficamos tranqüilos. O Tavinho, meu sobrinho mais velho, já tinha dezesseis anos e nadava bem. Foi o primeiro a pular na água. Em seguida saiu o Gabriel, com oito anos, vestindo um salva-vidas e sentado numa bóia.
Eu demorei um pouco mais a cair na água, esperando para verificar se estava tudo bem, e tentando convencer o Luiz a nadar também, coisa que ele prudentemente recusou.
Finalmente dei um mergulho e comecei a nadar um pouco em direção à praia. Quando estava a uns trinta metros do barco parei de nadar e olhei em direção a ele. E, surpresa, o barquinho ancorado parecia estar se deslocando.
Quase não acreditei. Achei que estava tendo uma impressão errada e demorei um pouco para reagir, mas não havia dúvida - ele estava se deslocando e ia em direção às pedras.
Meu coração disparou. Comecei a gritar para o Luiz ligar o motor, enquanto nadava como um louco tentando alcançar o barco. Na minha cabeça um turbilhão: O barco desgarrado em direção às pedras, meus sobrinhos na água, meu irmão dentro do barco não me escutava, não estava treinado sobre a operação do barco, e já estava assustado com aquele movimento. Uma tragédia.
Bom, não tinha outra alternativa senão rezar e nadar, rezar e nadar, e torcer para que o Luiz lembrasse de ligar o motor e se afastar, ou que o vento desviasse o barco para outra direção.
Finalmente, já totalmente sem fôlego e ainda longe uns cinquenta metros, percebi que o barco parou. Comecei a nadar com forças renovadas, sempre gritando para o Luiz: “liga o motor, liga o motor !”. Quando cheguei ao barco e subi pela escadinha, assumi o comando xingando meu irmão por não ter ligado o motor do barco. Só que ele havia tentado, mas a partida não funcionava. Tentei umas vinte vezes dar a partida, mas não ligava.
Apavorado com a situação, olhei para as pedras ali ao lado ainda sem entender porque o barco tinha parado, olhei para meu sobrinho pequeno indo embora em cima da bóia a uns cem metros do barco e sendo levado pela corrente, e me desesperei.
Enquanto tentava ligar o motor que não dava sinal, peguei o rádio e comecei a chamar desesperado: “Áquila Maris, Áquila Maris...Mayday....Mayday...Socorro Áquilamaris....”.
Aí veio a surpresa, na resposta do rádio: “Calma Cassstanho....(com aquele sotaque do Litoral, me respondia o funcionário da Marina)....calma....to te vendo aqui da praia....num fica afobado não...nós tamo aqui pertinho....”.
Com essa resposta eu fiquei paralisado: Será que estava exagerando, e não havia tanto perigo como eu imaginava ?
Não é possível, pensei....eu aqui com o barco preso nas rochas a dois metros da encosta – agora eu entendia que a âncora, providencialmente, havia prendido nas pedras do fundo e evitado o choque do barco com as pedras – meu sobrinho pequeno à deriva numa bóia, meu sobrinho maior mergulhando para salvar o irmão, eu tentando ligar o motor para tirar o barco das pedras, e o caiçara falando no rádio com aquele sotaque do Litoral: “calma Cassstanho, eu tô te vendo.....demorou....daqui a pouco eu mando alguém aí...”.
Bom, não dava para esperar aquela calmaria toda. Comecei a mexer no comando do motor, e aí descobri um profundo segredo: A partida só funciona se o comando estiver em ponto morto ! Na verdade, alguém deve ter esbarrado no comando, ou meu irmão mesmo, naquelas tentativas de fazer o motor funcionar. Encontrado o ponto morto, dei na chave novamente e Roooom...o motor pegou de primeira.
Aí, não tive mais dúvida: engatei uma ré e dei uma tremenda acelerada, desgrudando o ferro e soltando o barco das pedras.
Recolhemos então a âncora e fomos em direção aos dois sobrinhos que estavam a cerca de cem metros, flutuando em direção ao alto mar, completando o salvamento.
Foram necessários mais uns quinze minutos para o nosso “salvador” aparecer montado num Jet-sky, todo gabola, rindo e dizendo: “Que apavoramento foi esse, Cassstanho ? A gente tava aqui do lado”.
Por que não vieram nos salvar então ?, perguntei.
“Ah, eu só faço socorro se estiver naufragando....eu tava te vendo da praia...demorou...tava tranqüilo...”.
Bom, não preciso dizer aqui o que eu pensei, e o que falei para ele. Só posso dizer que fiquei com trauma daquele dia.
Hoje o funcionário não está mais lá, a Marina mudou de endereço e faz passeios maravilhosos de lancha pelo Canal de Bertioga saindo da praia da Enseada. E os donos continuam meus amigos.
Mas, não concordo com as brincadeiras dos amigos de meu sobrinho Percy Neto lá de Santos me imitando: “Aquilamaris, aquilamaris, socorro aquilamaris... mayday... mayday...”.Aquilamaris é a mãe.
Eu detesto essa brincadeira , mas os amigos do Percy Neto, meu sobrinho lá de Santos, insistem nela. Basta eu chegar para o coro começar: “Aquilamaris, aquilamaris, socorro aquilamaris”. E o culpado, novamente, é o meu irmão Luiz que não soube explicar a eles a situação dramática que passamos.
Na verdade, eu tive uma experiência traumatizante com minha primeira lanchinha, chamada El Niño. E o Luiz – gozador como ninguém - contou para todos como se fosse piada. E eles agora não perdoam: “Aquilamaris....”.
Vou contar como foi. Vejam se eu não tinha razão em ficar apavorado.
Eu encomendei uma lanchinha maravilhosa em São Paulo, no estaleiro Dumar, e quando ficou pronta escolhi uma Marina do Guarujá para guardar o barco. A Marina chamava-se Áquila Maris.
Essa Marina ficava na praia de Pernambuco, com saída por uma baía chamada de Mar Casado.
Até aí, tudo bem. Testamos o barco no Canal de Bertioga, foram feitos todos os acertos de hélice e comandos, e eu comecei a navegar aos poucos, saindo na primeira navegada com um dos sócios da Marina, para conhecer as redondezas.
Mas, marinheiro de primeira viagem, cometi alguns desatinos nos primeiros passeios, e vou contar alguns deles em breve.
Hoje quero falar desse episódio, que reflete uma ocorrência até comum entre os iniciantes, mas que poderia ter acabado em tragédia.
Num dos primeiros passeios com meu barco, ainda encantado com as possibilidades que se abriam, levei meu irmão Luiz e seus dois filhos, o Tavinho e o Gabriel, para um passeio.
Como ainda não tinha muita experiência, saímos do Mar Casado, demos a volta no morro e resolvemos ancorar na praia de Pernambuco, uma das mais bonitas do Guarujá.
Tudo dentro da normalidade, local abrigado, boa distância da praia, alguns barcos já estavam no local. Escolhemos um ponto e pedi ajuda ao Luiz para jogar a âncora enquanto eu manobrava o barco.
A grande falha estava na manobra de ancoragem. Eu deveria ficar com a proa voltada para o vento e não com a popa. Nesse pequeno descuido, e por total falta de preparo, acabamos ancorando bem em cima da âncora, sem folga no cabo.
Como não sabíamos disso, ficamos tranqüilos. O Tavinho, meu sobrinho mais velho, já tinha dezesseis anos e nadava bem. Foi o primeiro a pular na água. Em seguida saiu o Gabriel, com oito anos, vestindo um salva-vidas e sentado numa bóia.
Eu demorei um pouco mais a cair na água, esperando para verificar se estava tudo bem, e tentando convencer o Luiz a nadar também, coisa que ele prudentemente recusou.
Finalmente dei um mergulho e comecei a nadar um pouco em direção à praia. Quando estava a uns trinta metros do barco parei de nadar e olhei em direção a ele. E, surpresa, o barquinho ancorado parecia estar se deslocando.
Quase não acreditei. Achei que estava tendo uma impressão errada e demorei um pouco para reagir, mas não havia dúvida - ele estava se deslocando e ia em direção às pedras.
Meu coração disparou. Comecei a gritar para o Luiz ligar o motor, enquanto nadava como um louco tentando alcançar o barco. Na minha cabeça um turbilhão: O barco desgarrado em direção às pedras, meus sobrinhos na água, meu irmão dentro do barco não me escutava, não estava treinado sobre a operação do barco, e já estava assustado com aquele movimento. Uma tragédia.
Bom, não tinha outra alternativa senão rezar e nadar, rezar e nadar, e torcer para que o Luiz lembrasse de ligar o motor e se afastar, ou que o vento desviasse o barco para outra direção.
Finalmente, já totalmente sem fôlego e ainda longe uns cinquenta metros, percebi que o barco parou. Comecei a nadar com forças renovadas, sempre gritando para o Luiz: “liga o motor, liga o motor !”. Quando cheguei ao barco e subi pela escadinha, assumi o comando xingando meu irmão por não ter ligado o motor do barco. Só que ele havia tentado, mas a partida não funcionava. Tentei umas vinte vezes dar a partida, mas não ligava.
Apavorado com a situação, olhei para as pedras ali ao lado ainda sem entender porque o barco tinha parado, olhei para meu sobrinho pequeno indo embora em cima da bóia a uns cem metros do barco e sendo levado pela corrente, e me desesperei.
Enquanto tentava ligar o motor que não dava sinal, peguei o rádio e comecei a chamar desesperado: “Áquila Maris, Áquila Maris...Mayday....Mayday...Socorro Áquilamaris....”.
Aí veio a surpresa, na resposta do rádio: “Calma Cassstanho....(com aquele sotaque do Litoral, me respondia o funcionário da Marina)....calma....to te vendo aqui da praia....num fica afobado não...nós tamo aqui pertinho....”.
Com essa resposta eu fiquei paralisado: Será que estava exagerando, e não havia tanto perigo como eu imaginava ?
Não é possível, pensei....eu aqui com o barco preso nas rochas a dois metros da encosta – agora eu entendia que a âncora, providencialmente, havia prendido nas pedras do fundo e evitado o choque do barco com as pedras – meu sobrinho pequeno à deriva numa bóia, meu sobrinho maior mergulhando para salvar o irmão, eu tentando ligar o motor para tirar o barco das pedras, e o caiçara falando no rádio com aquele sotaque do Litoral: “calma Cassstanho, eu tô te vendo.....demorou....daqui a pouco eu mando alguém aí...”.
Bom, não dava para esperar aquela calmaria toda. Comecei a mexer no comando do motor, e aí descobri um profundo segredo: A partida só funciona se o comando estiver em ponto morto ! Na verdade, alguém deve ter esbarrado no comando, ou meu irmão mesmo, naquelas tentativas de fazer o motor funcionar. Encontrado o ponto morto, dei na chave novamente e Roooom...o motor pegou de primeira.
Aí, não tive mais dúvida: engatei uma ré e dei uma tremenda acelerada, desgrudando o ferro e soltando o barco das pedras.
Recolhemos então a âncora e fomos em direção aos dois sobrinhos que estavam a cerca de cem metros, flutuando em direção ao alto mar, completando o salvamento.
Foram necessários mais uns quinze minutos para o nosso “salvador” aparecer montado num Jet-sky, todo gabola, rindo e dizendo: “Que apavoramento foi esse, Cassstanho ? A gente tava aqui do lado”.
Por que não vieram nos salvar então ?, perguntei.
“Ah, eu só faço socorro se estiver naufragando....eu tava te vendo da praia...demorou...tava tranqüilo...”.
Bom, não preciso dizer aqui o que eu pensei, e o que falei para ele. Só posso dizer que fiquei com trauma daquele dia.
Hoje o funcionário não está mais lá, a Marina mudou de endereço e faz passeios maravilhosos de lancha pelo Canal de Bertioga saindo da praia da Enseada. E os donos continuam meus amigos.
Mas, não concordo com as brincadeiras dos amigos de meu sobrinho Percy Neto lá de Santos me imitando: “Aquilamaris, aquilamaris, socorro aquilamaris... mayday... mayday...”.Aquilamaris é a mãe.

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